Acompanhe tudo que acontece no Mês da Mulher AASP 2023
“Não só a linguagem, o uso da palavra advogado, os tribunais, mas tudo sempre se refere ao universo masculino”.
Na última segunda-feira (4/3) ocorreu o segundo webinar da temporada, tendo por tema “Justiça brasileira: a mulher como protagonista em carreiras jurídicas”. O evento foi composto por Viviane Girardi (ex-Presidente da AASP); Ana Elisa Bechara (Vice-Diretora da Faculdade de Direito do Largo São Francisco); Daldice Maria Santana de Almeida (Desembargadora Federal do TRF-3); e Patricia Vanzolini (Presidente da OAB-SP).
Girardi, que atuou como mediadora do painel, agradeceu o convite para compor o debate, pontuando que a Associação não só comemora o Dia da Mulher, como dedica um mês inteiro às temáticas que trazem um protagonismo e visibilidade ao exercício da advocacia feminina. Ressaltou ainda que tomou a liberdade de ir vestida com uma beca pensada estritamente para as mulheres. Nascida dentro de um coletivo de mulheres advogadas criminalistas, que posteriormente expandiram a ideia para as colegas das demais áreas, o intuito da vestimenta de cores preta e grená foi o de tornar confortável e airoso o exercício da advocacia dentro dos Tribunais do Júri. “Não só a linguagem, o uso da palavra advogado, os tribunais, mas tudo sempre se refere ao universo masculino, principalmente a vestimenta utilizada”, afirmou a ex-Presidente da AASP.
Ana Elisa Bechara iniciou a exposição tratando especificamente do subtema: Por que precisamos de mais mulheres em cargos de liderança no Direito?. “Esse me parece de fato um tema mais que importante, um tema urgente, mais que fundamental”, afirmou a professora, que complementou “existe uma gritante desproporção de gênero, de maneira geral, na cúpula de Direito brasileiro. É como se houvesse uma dicotomia entre gênero e mérito”, finalizou.
Bechara afirmou também que ocorre um questionamento sobre a capacidade que as mulheres possuem para o exercício da liderança. “Quando a gente fala da inequidade de gênero que caracteriza nossa sociedade, a consequência mais dramática é a violência contra a mulher […], que já é algo normalizado”. Citou sobre a disparidade trabalhista entre os cargos, o racismo estrutural que afeta diretamente o exercício profissional de mulheres pretas, relembrando o período da Inquisição no qual as mulheres eram condenadas à morte por serem acusadas de suposta bruxaria. “O Direito não é neutro, a existência dessa parcialidade resulta em um tratamento paternalista ou mais rígido levando em consideração o comportamento dessa mulher”, aduziu.
Além disso, ressaltou que existe um papel que é socialmente exigido das mulheres, que é o de inferioridade sexual e intelectual. Função natural de reprodução da espécie e cuidado da prole são alguns dos argumentos utilizados durante séculos para fortalecer esse papel. “Cabe somente ao homem o espaço público de liderança, pois se uma mulher se impõe e começa a exercer uma posição que não lhe é esperada, ela ganha adjetivos negativos, tais como louca, megera, mal-amada, bruxa, e assim vai”, explicou Bechara. “Podemos perceber uma distinção de tratamento perante as mulheres principalmente no âmbito penal, não só quanto à capacidade, mas também quanto à sua palavra, que é sempre alvo de questionamento sendo ela ré ou autora de um processo penal”, finalizou a professora.
Em seguida, Daldice Maria Santana de Almeida iniciou seu discurso dizendo estar muito satisfeita e feliz pelo uso da beca que Viviane Girardi vestiu na data, dizendo que é de suma importância que ideias assim sejam compartilhadas pelo aprendizado social que elas apresentam. “É muito importante e difícil a mulher ocupar um espaço de poder e liderança, sendo que de liderança é ainda mais viável do que o de poder, já que sabemos que este segundo está ligado ao exercício de autoridade”, afirmou a desembargadora. “Nós temos a terceira melhor lei de proteção à violência doméstica e, mesmo assim, continuamos sendo o quinto país de maior número de feminicídio mundial”.
A desembargadora fez alusão às ordenações filipinas, nas quais as mulheres poderiam ser mortas por adultério, fato que objetificava e as desumanizava. “Para alguns segmentos da sociedade, a Constituição ainda é um projeto […]. É uma promessa de igualdade futura”, encerrou Daldice.
Girardi teceu alguns comentários sobre a figura do sujeito de direito, aduzida constantemente pelos estudiosos da área. “Quando falamos da categoria do sujeito de direito nos vem à mente o sujeito masculino, pai de família, dono da fábrica, o homem contratante, etc., sendo sempre o imaginário masculino que toma a frente”, aduziu a mestre. Na visão de Girardi, é necessário que as mulheres sejam pensadas sob a perspectiva feminina, e não sob a masculina.
Patricia Vanzolini finalizou o segundo painel da temporada focando sua fala na visão da mulher como advogada. Afirmou que as mulheres são “expulsas” da profissão, muitas vezes, por conta da maternidade, uma vez que se tem a falsa ideia de que uma mulher não pode ter uma vida profissional e maternal concomitantes, sendo sempre necessário que optem por uma delas. “Uma mulher que precisar se preocupar com uma tripla jornada de trabalho não pode se dedicar integralmente à sua tese de doutorado e ainda cuidar de filhos. Isso é, estruturalmente, uma desigualdade tamanha que acaba afastando as mulheres da ascensão e do sucesso profissional”, afirmou Vanzolini. Teceu ainda, alguns comentários acerca da presença de advogadas lactantes que precisam amamentar durante a sua jornada de trabalho.
“Nós mulheres advogadas temos plena capacidade de exercer a advocacia, mas nós queremos ter liberdade para tanto”, concluiu a Presidente da OAB-SP. O painel foi encerrado por Viviane Girardi, que agradeceu a presença tanto das convidadas painelistas quanto daqueles que acompanharam a explanação, ressaltando a importância que o tema apresenta perante nossa atual sociedade.
A AASP
Fundada há 81 anos, a AASP – Associação dos Advogados está presente em todo o Brasil e tem a missão de potencializar e facilitar o exercício da advocacia. A entidade é experiente, visionária e está, cada vez mais, disruptiva. Sua trajetória e conquistas são o combustível para ir ainda mais longe, proporcionando aos seus milhares de associados (aproximadamente 70 mil) inúmeros cursos sobre temas jurídicos relevantes e serviços de excelência, que incluem: intimações on-line, emissão e renovação de certificado digital, revistas e boletins periódicos, clipping diário de notícias, plataforma de assinaturas digitais, além de disponibilizar um avançado sistema de pesquisa de jurisprudência e um programa de gestão de processos.